Dor no bolso: pequenos do RJ temem um Carioca vazio com a Sul-Minas-Rio


Presidentes dos 12 clubes de menor investimento cobram, assim como Botafogo e Vasco, uma atitude da CBF e calculam prejuízo. "Seria o fim", afirma Elias Duba

Os bastidores do futebol carioca fervilham. De um lado, estão Flamengo e Fluminense. Do outro, Vasco, Botafogo, Ferj (que é a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) e todos os 12 clubes de menor investimento que disputam a elite do estadual. A rebeldia da dupla Fla-Flu tem gerado a revolta dos demais, sobretudo no que diz respeito à possibilidade de realização de uma Liga Sul-Minas-Rio já no primeiro semestre do ano que vem - a "nova entidade", formada por equipes de RJ, MG, PR e SC, pretende apresentar uma proposta de calendário nos próximos dias. Um futuro nebuloso e com muito prejuízo é o que preveem os chamados pequenos.
Desses, o que menos depende do Carioca é o Macaé, que está na Série B do Brasileiro e recebe R$ 270 mil mensais de cota de televisão. O restante (Madureira, Bangu, Friburguense, Volta Redonda, Resende, Friburguense, Boavista, Cabofriense, Tigres, America e Portuguesa) tem no estadual a grande fonte de recurso da temporada e teme, portanto, um possível esvaziamento com outra competição sendo disputada paralelamente. 
Arbitral da Ferj (Foto: Úrsula Nery / Agência FERJ)Clubes se reuniram com a Ferj há uma semana e cobraram uma atitude da CBF (Foto: Úrsula Nery / Agência FERJ)
Por isso mesmo, todos os 12 clubes mais Vasco e Botafogo assinaram, na segunda-feira da semana passada, uma nota declarando total descontentamento com o nascimento da Liga Sul-Minas-Rio e cobrando uma posição mais severa da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Além disso, o que estremece os nervos dessas agremiações é o fato de que o contrato de transmissão do Carioca termina agora, e será preciso uma renegociação de valores para 2016. A chance de Flamengo e Fluminense entrarem em campo com os reservas não ajuda em nada nas conversas.
O GloboEsporte.com reuniu o posicionamento de 10 desses times pequenos quanto a toda polêmica. Teodomiro Bittencourt, presidente do Macaé, e João Maria do Rêgo, mandatário da Portuguesa-RJ, foram procurados, mas não se manifestaram até o fechamento desta reportagem.
LÉO ALMADA, AMERICA
Achamos que o futebol brasileiro não merece ser partilhado, não merece sofrer nenhuma cisão. Essa cisão não é boa nem para os considerados grandes, nem para os pequenos.
Léo Almada
- Sendo rigorosamente sincero, a diretoria do America está tomando o maior cuidado para não emitir nenhuma opinião apressada sobre o caso. Tenho muita cautela e preocupação sobre isso. Achamos que o futebol brasileiro não merece ser partilhado, não merece sofrer nenhuma cisão. O America prima pela paz em todos os sentidos. Achamos que a melhor coisa é a reconciliação de todos antes que algo de ruim ocorra. Eu sou favorável que ninguém seja prejudicado. Mas caso ocorra essa cisão, creio que os principais abalados serão os clubes de menor investimento. É preciso que fique claro que o America não é pequeno. É um time de menor investimento no futebol neste momento, mas é maior que todos os outros. Tem patrimônios, tem uma sede nova em construção e tem estádio. E achamos que essa cisão não é boa nem para os considerados grandes, nem para os pequenos. Torço para que tudo fique bem para que ninguém tenha nenhum prejuízo.
JORGE VARELA, BANGU
Os clubes menores tomarão um prejuízo sem tamanho. Em alguns casos, pode ser até extremo. 
Jorge Varela
- Se houver a Copa Sul-Minas, vai ser muito danoso para os clubes de menos investimento. Um prejuízo que não dá nem para calcular. Os clubes menores tomarão um prejuízo sem tamanho. Em alguns casos, pode ser até extremo. Creio que a linha de pensamento é igual para todos os pequenos. Será um prejuízo sem dimensão. Os clubes grandes não estão pensando no coletivo, somente no individual. O enfraquecimento do Carioca não é bom para ninguém. O fortalecimento é bom para todos. Dividir não é melhor do que somar. Não existe isso. Se todos caminharem juntos, podemos fortalecer o Carioca e criar uma competição que seja melhor tanto para os grandes quanto os pequenos.
JOÃO PAULO MAGALHÃES, BOAVISTA
Eu acho uma pena. Eles (Fla e Flu) estão muito individualistas, e isso é muito ruim para o futebol do estado. Estão fazendo uma queda de braço em que, no final, os maiores prejudicados serão eles. 
João Paulo Magalhães
- Eu acho, e vou ser bem sincero, uma pena Flamengo e Fluminense estarem fazendo isso para desvalorizar o produto que eles próprios participam... e vão participar, porque eles não vão não jogar o Carioca. Não quero criticar os presidentes de Flamengo e Fluminense, mas acho que eles poderiam tomar uma postura diferente, entendeu? Eles estão muito individualistas, e isso é muito ruim para o futebol do estado. Eles estão pensando só neles, não estão pensando em todos os clubes. Flamengo e Fluminense precisam de Vasco e Botafogo assim como Botafogo e Vasco precisam de Flamengo e Fluminense. É a rivalidade que torna os clubes grandes. Eles não estão pensando nisso, estão pensando só neles, em desafiar. Só o que eu posso dizer de tudo isso é que é uma pena. O torneio não vai acontecer em 2016, o calendário da CBF já foi publicado. Eles querem fazer em 2017, mas eu não vejo espaço no futebol para isso. Eles estão fazendo uma queda de braço em que, no final, os maiores prejudicados serão eles. 
JOSÉ FERREIRA SIMÕES, BONSUCESSO
Eles (Fla e Flu) esquecem que se tornaram grande por causa do Campeonato Carioca, que é disputado há 100 anos. Querem massacrar os times pequenos.
José Ferreira Simões
- É uma coisa que incomoda. Isso vislumbra em um prejuízo no futebol. É muito fácil eles fazerem o trabalho para acabar com o Campeonato Carioca. Eles esquecem que se tornaram grande por causa do Campeonato Carioca, que é disputado há 100 anos. Querem massacrar os times pequenos. É muito difícil, mas vamos lutar para que isso não saia, aliás, já saiu, mas para não se oficializar. Eu não estou acreditando muito nessa possibilidade, não, de eles disputarem esse torneio. Até porque eles têm muitos compromissos com os patrocinadores, com a TV. Então eu acredito que não há hipótese nenhuma de eles não disputarem o Carioca. Caso venha a acontecer, deverá causar um prejuízo muito grande realmente. A CBF tem que definir isso logo. A Liga foi criada no registro de pessoas jurídicas, mas, de acordo com o estatuto da CBF, que tem em um dos seus artigos, uma lei que dá a Federação e a CBF o direito de aceitar ou não. Então esse estatuto tem que ser cumprido. A CBF já até divulgou o calendário do ano que vem e não tem nada de Sul-Minas.
VALDEMIR MENDES, CABOFRIENSE
Ainda bem que Vasco e Botafogo têm essa posição. Eu diria que tudo isso é uma falta de elegância com os rivais. Estamos ao lado de Botafogo e Vasco e vamos sempre votar ao lado da Ferj.
Valdemir Mendes
- Na verdade, temos que esperar tudo, esperar primeiro oficializar tudo de verdade. Como vai ficar a televisão nisso? Já que é ela que banca o Carioca. Vamos aguardar o posicionamento da TV, como a TV vai se manifestar. Alguns clubes adiantaram a cota da TV até não sei quando em cima do Carioca, como vai fazer com isso? É essa situação que a gente realmente quer entender. Como somos de times pequenos, não conseguimos muito acompanhar a negociação, só podemos aguardar o que vem de cima. O calendário foi aprovado para 2016, a situação está aprovada, definida. Muita gente que joga a Copa Rio já está definindo o elenco para o ano que vem. Espero que a CBF possa se posicionar o mais rápido possível para que possamos trabalhar com tranquilidade. Acho muito difícil... como vai fazer para todo mundo participar desse campeonato? Na verdade, temos o posicionamento de dois clubes apenas. Nós somos 16, e apenas dois se manifestaram para jogar a Rio-Sul-Minas. Então, como temos dois clubes se posicionando dessa forma e 14 de forma diferente? E a maioria? Ainda bem que Vasco e Botafogo têm essa posição. Eu diria que tudo isso é uma falta de elegância com os rivais. Estamos ao lado de Botafogo e Vasco e vamos sempre votar ao lado da Ferj.
JOSÉ EDUARDO SIQUEIRA, FRIBURGUENSE
De verdade, esse processo só ia deixar os pequenos ainda mais enfraquecidos. Tanto Flamengo quanto Fluminense foram altamente infelizes nessas decisões.
Siqueirinha
- Minha opinião é bem clara. Existe um calendário que precisa ser cumprido, não tem nenhum motivo para a CBF aceitar essa Copa Rio-Sul-Minas. Assinamos a nota de repúdio para mostrar justamente isso. Dentro do estatuto da federação, existe uma série de sanções que impedem isso. A CBF precisa tomar uma atitude quanto a isso, para não virar essa coisa toda e atrapalhar o Carioca. De verdade, esse processo só ia deixar os pequenos ainda mais enfraquecidos. Tanto Flamengo quanto Fluminense foram altamente infelizes nessas decisões. Em vez de pensar pelo lado do estadual, valorizar os pequenos... A história do Flamengo não começou com o Bandeira e nem a do Fluminense com esse atual presidente. Vários jogadores deles foram formados nos pequenos. Acho que a CBF está fria, teria realmente que tomar uma decisão, se pode ou não pode acontecer. Na verdade, não pode. Uma coisa somos eu e você formarmos uma liga, mas essa liga funcionar da forma que eles estão falando é outra coisa. A CBF tinha que ter uma atitude, não tem a mínima possibilidade disso acontecer. Temos que louvar a atitude de Botafogo e Vasco, que estão se posicionando ao lado do futebol carioca. Eles estão buscando a situação que é o melhor caminho. Sem desmerecer a Copa Rio, que é um campeonato onde eu coloco meus jogadores em atividade, mas nós só temos o Carioca. Nesse processo de esvaziamento do Carioca, lógico que os mais prejudicados serão os pequenos. Sempre o que interessa no futebol são os grandes negócios. Não existe Carioca e fortalecimento de Flamengo e Fluminense sempre os pequenos. Falta a consciência de que o que fez o Flamengo e o Fluminense grande nesses 100 anos foram os pequenos. Aí por causa de dois presidentes que pensam de forma diferente... 
ELIAS DUBA, MADUREIRA
Para mim, isso é uma rebeldia. Se fala tanto em calendário apertado, muitos jogos, quer dizer, eles vão criar um novo torneio paralelo. Ou seja, seria o fim dos pequenos.
Elias Duba
- Eu também acho que a CBF está muito branda em relação a isso, precisa de um posicionamento. Até porque os presidentes de Flamengo e Fluminense já deram uma declaração na semana passada dizendo que esse é o primeiro passo para fundar uma liga nacional. Eu não vejo o porquê da liga se você tem as federações e as confederações. Isso passa através delas, não através da rebeldia. Para mim, isso é uma rebeldia. Se fala tanto em calendário apertado, muitos jogos, quer dizer, eles vão criar um novo torneio paralelo. Ou seja, seria o fim dos pequenos. Para mim, o Madureira é um clube pequeno. Disputa uma competição nacional sim, mas a única competição atraente que o Madureira disputa, que é o estadual, seria esvaziada ainda por dois clubes tradicionais do Rio de Janeiro. Eu queria ver uma pesquisa feita nas torcidas de Flamengo e Fluminense para saber se eles concordam com isso, porque eu realmente acho que não. Acho também que os presidentes de Cruzeiro e Atlético-MG, Grêmio, Inter, dos clubes de Santa Catarina e do Paraná estão de carona com isso aí, porque lá a expressão dos estaduais é nenhuma. São clubes tradicionais, mas o campeonato deles não tem expressão como o do Rio e de São Paulo. Não vejo sucesso de público nesses torneios, também não veria nenhuma atração por parte dos meios que transmitem, televisão em si. Acho que a CBF tinha que se posicionar.
RICARDO TUFICK, RESENDE
Eles (Fla e Flu) têm que respeitar a democracia. Enfraquecer os estaduais trará um prejuízo enorme ao futebol, inclusive com vários clubes fechando as portas, gerando um desemprego imenso.
Ricardo Tufick
- A posição do Resende já foi tomada na reunião da última segunda. Flamengo e Fluminense só estão pensando em seus interesses. Eles têm que respeitar a democracia. Enfraquecer os estaduais trará um prejuízo enorme ao futebol, inclusive com vários clubes fechando as portas, gerando um desemprego imenso. O Futebol do Rio não se restringe à dupla Flamengo e Fluminense. Os dois possuem dezenas de jogadores oriundos de clubes de menor investimento. Os clubes de menor investimento têm uma função social muito grande e estarão com os dias contados se os estaduais forem enfraquecidos ou terminarem. Juridicamente, Flamengo e Fluminense não têm como disputar esse torneio pois ele não está publicado no calendário da CBF.
ARISTÓTELES LARIOS, TIGRES
A Copa Sul-Minas em substituição do Carioca quebraria a cadeia dos pequenos, que são os formadores de jogadores. Você afetaria diretamente os times de menor investimento.
Aristóteles Larios
- Na verdade, não posso opinar sobre a Copa Sul-Minas especificamente, porque não participamos. Mas ter essa competição em substituição ao Carioca não faz sentido. O Carioca é uma competição com décadas de história, com todo um prestigio. Não faz sentido algum colocar as duas competições juntas. Se for para fazer, que ela seja feita em outro momento. A Copa Sul-Minas em substituição do Carioca quebraria a cadeia dos pequenos, que são os formadores de jogadores. Você afetaria diretamente os times de menor investimento. O Carioca ficaria enfraquecido, sem cobertura de mídia, sem o mesmo retorno. Os clubes de menos investimento deixariam de revelar tantos jogadores. Eu creio que a Sul-Minas não vai vingar. Mas você atrapalharia toda uma cadeia dos clubes pequenos. Não só financeiramente, mas em diversos aspectos.
FLÁVIO HORTA, VOLTA REDONDA
Dois clubes não podem querer se beneficiar em detrimento dos outros 14.
Flávio Horta
- O Volta Redonda é defensor do Campeonato Carioca e de seu fortalecimento. Sobre a criação da liga, não tenho o que me manifestar, uma vez que qualquer um pode criar. Agora, sobre essa liga realizar um torneio Rio-Sul-Minas, o Volta Redonda é radicalmente contra, porque seria junto com o Estadual e acabaria desvalorizando a competição. Dois clubes não podem querer se beneficiar em detrimento dos outros 14. Aguardamos que a CBF se posicione contra, não homologando o torneio, já que ela própria já divulgou o calendário de 2016 e não consta a realização do Rio-Sul-Minas.
*Participaram da apuração Gustavo Garcia, Juan Andrade, Tébaro Schmidt e Vinícius Lima.

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